Seminário “Mercosul: Análise e Perspectivas”

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CAENI-BID/Intal-IPEA

Gazeta Mercantil. São Paulo, 22 de Agosto de 2003 – Difícil recuperar “magia” dos anos 1994-98. Déficit levaria Argentina a pedir cláusula de escape. Iniciativas como a de relançamento do Mercosul e de coordenação macroeconômica, no governo passado, e as atuais – Objetivo 2006 (proposta brasileira), instituto monetário (sugestão da Argentina), tratamento de assimetrias (proposta paraguaia) e incorporação de flexibilidades (projeto uruguaio) são típicas de períodos de crise, em que “a demanda por coordenação aumenta”. No momento, porém, os “instrumentos não estão disponíveis para a coordenação. O tema é como recuperar a estabilidade cambial e o crescimento na região”, avalia o economista Ricardo Rozemberg, diretor do Centro de Estudos para a Produção do Ministério da Economia e Produção da Argentina. Ele preparou o informe 2001-2002 sobre o Mercosul, publicado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Instituto para a Integração da América Latina e Caribe (Intal) e apresentado ontem, em São Paulo. Apesar da vontade política de reanimar o Mercosul, com uma agenda que inclui propostas ambiciosas, falta muito para o bloco recuperar a “magia” dos anos 1994 a 1998, acrescenta o economista argentino. Um exemplo da perda de dinamismo do Mercosul, segundo ele, é o comércio regional de frutas, que em 2001-2002 era 57,7% do que foi nos anos 1997-98. Em 2001-2002, o comércio bilateral de lácteos (Brasil-Argentina) era 50% do que havia sido em 97-98.

A participação argentina nas exportações do Brasil, que era de 13% em 1998, caiu para 4% em 2002, diz Rozemberg. Esse quadro mudou um pouco no primeiro semestre deste ano, com o início de recuperação da Argentina, cuja participação nas vendas do Brasil subiu para 6%, enquanto as exportações argentinas para o mercado brasileiro continuam caindo, o que incomoda os industriais do país vizinho, que querem salvaguardas e medidas restritivas.

A Argentina deverá pedir uma “cláusula de escape” ao Mercosul, revelou Rozemberg, no lançamento do informe sobre o Mercosul organizado pelo Centro de Estudos de Negociações Internacionais (Caeni), BID/Intal e Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Cláusula de escape é um mecanismo que permite a violação das regras de um determinado acordo, sob certas condições. Em comércio internacional, o exemplo clássico de cláusula de escape são as salvaguardas (artigo XIX do Gatt, Acordo de Salvaguardas).

O bloco está distante da realidade do período 1994-98. “Foram anos dourados, quase mágicos da integração, em que havia estabilidade cambial e monetária, os ciclos econômicos dos países eram comuns, o fluxo de capitais permitia financiar desequilíbrios e tínhamos comércio intersetorial equilibrado”, como na indústria química e têxtil, lembra Rozemberg. A partir de 1999, começa a crise nos países do Mercosul – Brasil e Argentina têm ciclos produtivos negativos, o mercado regional perde dinamismo, os fluxos de capitais retornam ao nível do início dos anos 90 e ocorre uma série de retrocessos. Começa-se a duvidar de um processo de economia de desenvolvimento”. Além disso, alerta o economista argentino, um padrão de comércio bilateral em que o Brasil exporte manufaturas e a Argentina, produtos agrícolas “não é sustentável”.

Pensando o futuro

Na avaliação de Rozemberg, em vez de iniciativas ambiciosas, os países do Mercosul deveriam trabalhar em uma “agenda pequena de temas porque os princípios básicos da integração estão questionados”. O autor do Informe Mercosul sugere uma revisão da Tarifa Externa Comum (TEC) com reduções em algumas alíquotas altas, o que seria “um sinal político importante”. Outras medidas sugeridas: “limpar a mesa de barreiras comerciais; determinar um pequeno conjunto de disciplinas que permitam o livre comércio; ter uma instituição para administrar o intercâmbio; avançar nas cadeias de valor regionais e na agenda institucional; criar uma instância independente técnica para trabalhar em questões relacionadas com a agenda externa; aperfeiçoar o processo de internalização das normas; melhorar o acesso participativo nos mecanismos de solução de controvérsias; propiciar maior participação dos parlamentares e da sociedade civil no Mercosul”.


Maria Helena Tachinardi

fonte: Gazeta Mercantil